sábado, 24 de dezembro de 2011

Filmes de 2011

Um amigo pediu minha opinião sobre os filmes da lista de melhores do ano do jornal Valor Econômico. Dos campeões, só não assisti a Árvore da Vida. Sobre os outros, enviei-lhe os comentários que aqui reproduzo. Lembro apenas que opinião é coisa pessoal, cada um tem a sua. Questão de gosto, de momento e de conhecimento. Se não gostei de alguma coisa, pode ser que não estivesse preparado para entendê-la. Ou, ainda, que não estivesse "no clima do filme". Enfim, fiquem à vontade para discordar.

Melancolia - Talvez eu não tenha entendido o filme, mas não achei nenhuma maravilha. Sou um grande fã de Lars von Trier, mas achei esta obra apenas melancólica (bem, talvez seja este o objetivo mesmo). Parece que o diretor, em toda a sua depressão, quis dizer que o mundo não vale a pena e pronto. Não há a ironia de "Os Idiotas", a contundência de "Dançando no Escuro" ou o apuro artístico e simbólico de "Anticristo". Acho que ele se perdeu um pouco. O mais significativo do filme foi ele ter convencido a Kirsten Dunst a ficar nua em uma cena sem importância. É aquela história do diretor cult colocando uma atriz famosa em situação vulnerável, o que é irônico como exercício do poder.

A Pele que Habito - É um bom filme, interessante, mas está longe de ser o melhor Almodovar. Não chega aos pés de "Fale com Ela", "Tudo Sobre a Minha Mãe", "Volver" ou "A Flor do Seu Segredo". Mas é melhor do que "Kika" e "Má Educação". Um Almodovar mediano, o que já é um bom motivo para assistir.

Meia-Noite em Paris - Um excelente filme de Woody Allen, com cara de Woody Allen (ao contrário de "Vicky Cristina Barcelona", que é muito bom, mas não parece Woody Allen). Gostei mais do que dos dois anteriores, que também são bons ("Você Vai Conhecer o Homem dos seus Sonhos" e "Tudo Pode dar Certo"). "Meia-Noite em Paris" é uma ótima lição para saudosistas. Adorei.

O Garoto da Bicicleta - Bom, mas eu esperava mais. Talvez seja o raio da expectativa, já que ouvi tanta gente elogiar antes de eu assistir. Acho que não é o tipo de filme que arrebata, mas é uma história bem interessante: uma mulher que passa a cuidar de um menino sem nenhum motivo. O garoto apronta e ela resiste, com uma paciência de Jó, compreendendo a revolta e a solidão do moleque. O garoto é um ótimo ator, muito bem dirigido. Mas o filme não chega a emocionar muito. O que talvez seja até uma qualidade, pois o risco de debandar para o melodrama é grande. Os diretores não apelaram para emoções baratas, o que é uma qualidade, sem dúvida.

O Palhaço - Gostei muito. Acho que o Selton Mello podia cortar algumas cenas ("Eu faço as pessoas rirem, mas quem é que vai me fazer rir?" é um pouco óbvio. Este tipo de melancolia está estampado na cara do personagem, não precisava colocá-lo em palavras, em uma cena sem grande função e que, repetida tantas vezes nos traillers, torna-se incômoda), mas é um filme capaz de levar às lágrimas. Singelo, honesto, sensível e nostálgico. Caetano Veloso diria que é um filme saído do "Brasil profundo". E é. Genuinamente brasileiro, repleto de emoções universais, como um "Cinema Paradiso" (universal, sendo italiano).

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Irrelevâncias legislativas e promiscuidades judiciárias

A revista Veja desta semana (data de capa 28/09) comenta um assunto que já havíamos abordado aqui no post "A lei na calcinha". A reportagem de Veja aborda várias leis ou projetos de leis irrelevantes ou inúteis. Chega à mesma conclusão a que já havíamos chegado: nosso Poder Legislativo não produz reformas relevantes porque perde muito tempo com bobagens.

A reportagem usa, ainda, uma frase que costumo repetir: "no Brasil, parte-se do princípio de que todo o mundo é culpado". Esta é uma razão para termos tantas leis e tanta burocracia. E as coisas só pioram. No fim das contas, a vida do brasileiro honesto fica mais difícil e os corruptos continuam agindo do mesmo jeito. Era preciso que houvesse menos leis e que elas fossem interpretadas pelos juízes de forma mais ampla, a partir de critérios éticos. No Brasil, o sujeito pode ser sabidamente ladrão mas encontrar um brecha no cipoal legislativo para escapar das punições previstas.

A burocracia gerada por este exagero legislativo às vezes sai mais cara do que os desvios que ela se propõe a coibir. Uma multidão de funcionários públicos é necessária para carimbar papéis, conferir e acumular documentos. Já fiz parte da burocracia estatal mais de uma vez. Falo com conhecimento de causa.

Outra matéria da revista reforça a nossa sensação de impotência, de estar vivendo em um país muito estranho. Trata das relações de amizades entre juízes, advogados de defesa e réus. Um absurdo total. Em princípio, os juízes deveriam se declarar impedidos de julgar casos em que o réu é um amigo. Não parece ser o que acontece em nossa terra. Mesmo nas mais altas esferas, segundo revela a Veja.

A ladroagem que produz novas leis e processos burocráticos e as relações suspeitas na área jurídica são frutos de uma mesma lassidão moral, um clima de "nada a ver" (como diz J.R Guzzo em seu artigo na última página da mesma revista) que grassa neste país. É triste, é desesperador. E é pena que os defensores da ética do passado, hoje chamem os que ainda se revoltam de "golpistas de direita", quando, na verdade, há gente de todos os espectros incomodada com o atual estado das coisas. Tanto quanto estava antes. Porque a ética e a ladroagem não são exclusividade de nenhuma corrente política.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Acontece comigo também

Tentei secar os olhos de Maria
e não consegui.
Suas mãos frias, eu não pude reter.
Moveu-se para frente.
Balançou-se.
Gemeu.
Abracei-a por trás.
Aproximei sua cabeça do meu peito.
Soluçou.
Fechei meus olhos e continuei a segurar seu rosto.
Docemente.
Gentilmente.
Acalmou-se. Um pouco.
Não olhou para mim.
Olhava para dentro de si.
Para além.
Sonhara.
Eu sabia com o quê.
Acontece, às vezes. Comigo também.

[18.01.2009]

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Sanguínea madrugada

Nada impede que eu te ame. Foram vinte? Trinta anos? Pouco importa: nada impede que eu te ame. O tempo e a distância intransponíveis não impedem que eu te ame. Como sempre. Como desde o primeiro dia. Nossos brinquedos, nossas brigas, nossa mútua compreensão, nossos desentendimentos. Quarenta anos seriam? Fossem cem e, ainda assim, eu te amaria. Nem a desdita, esta ávida pantera, nem mesmo ela me impede de te amar. O fígado que sofre, a dor que vem da medula, a vertigem do corpo no espaço, o coração que fraqueja, nada impede. Além da existência, por quantos anos restarem, até o fim dos dias, nada me impedirá de te amar.

[11.09.2011]

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Show de Diogo Cadaval no Espaço Rio Carioca

Sexta-feira, 15 de julho, Diogo Cadaval mostra as músicas de seu primeiro disco, "Sem Par", no Espaço Rio Carioca (Rua das Laranjeiras, 307). Violonista de mão cheia, Diogo faz música brasileira de alta qualidade, com harmonia elaborada e precisão rítimica.

No CD - e acredito que no show também - estão presentes algumas belas composições solo, como "Maria Teresa" e "Barquinho". Mas o que já era bom ficou ainda melhor quando a música de Diogo encontrou a poesia de Leandro Jardim. "Canson" e "Marcha da Volta", respectivamente a primeira e a última parceria da dupla no disco, são belíssimos exemplos de boa letra e boa música. A parceria com Lucas Zardo, produtor do CD com Diogo, também gerou bons frutos, como a empolgante "Só Pra Ver Sambar".

Para quem gosta de música brasileira, recomendo bater ponto no show do Diogo esta sexta-feira e descobrir uma nova fera do nosso cancioneiro. Quem não está no Rio de Janeiro pode conhecer o trabalho do rapaz no site http://www.diogocadaval.com/.

domingo, 5 de junho de 2011

Meu Umbigo viu "Todo Mundo Tem Problemas Sexuais"

Sou um frequentador do cinema brasileiro. Lamento que ele esteja, em parte, descambando para uma espécie de TV Globo na tela grande. "De Pernas Pro Ar", por exemplo, é uma mistura de Zorra Total e Sob Nova Direção com uma p(e)itada de Casseta e Planeta, na pele da Maria Paula. Um filme ruim toda vida. É melhor quando ocorre o caminho inverso e, por exemplo, "Cidade de Deus" dá origem a "Cidade dos Homens".

Mas, que seja: se o cinema dito "comercial" não sufocar o cinema dito "de arte", tá tudo certo. Se levar o público ao cinema e gerar renda para nossos técnicos, produtores, diretores, atores e toda a entourrage, beleza. Assim, talvez os produtores possam investir parte desta receita em filmes mais autorais.

E justamente porque sou um entusiasta do cinema brasileiro - e de caras como Domingos de Oliveira, que fazem filmes com uma marca própria - fui assistir a "Todo Mundo Tem Problemas Sexuais", ainda em cartaz, mas provavelmente não por muito tempo, como quase toda fita brasileira. É talvez o filme mais engraçado do Domingos. E também o tecnicamente mais fraco. Se ainda não viram, leiam minha resenha no Multiply: http://eduardoviana.multiply.com. E, se já viram, concordem ou discordem aqui.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

A lei na calcinha

No último dia 10 de maio, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei (PL) que obriga a inserção de etiquetas nas roupas íntimas para adultos – sutiãs, calcinhas e cuecas – alertando para a importância do exame preventivo de câncer de mama, de colo de útero e de próstata, respectivamente.

A proposta foi apresentada pelo ex-deputado Barbosa Neto (PMDB-GO) em 1999. Seis anos depois, foi encaminhada ao Senado Federal, que, após quase três anos de deliberação, devolveu à Câmara com alterações. Até aqui, foram 12 anos, dois meses e oito dias de tramitação. Eu me divirto quando vejo a peregrinação de uma lei no Congresso Nacional. Quem tiver curiosidade de verificar o percurso desta aqui, pode acessar http://www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=15227. É preciso ir ao site do Senado para ver o que ocorreu no período em que o PL esteve por lá. Minha paciência não vai tão longe assim.

Mas não escrevi este post para falar sobre a morosidade do Congresso Nacional. O objetivo era comentar a irrelevância de algumas leis. Não há nada mais importante para os nossos legisladores fazerem do que discutir bobagens como esta? Em 12 anos (e sabe-se lá quanto tempo isso ainda levará), é bem possível que se conseguisse convencer os fabricantes de roupas íntimas a abraçarem tão nobre causa, sem que fosse necessária a coerção da lei.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Osama, Obama e o discurso do triunfo

ou "Everybody is filhos de God"

Não estou triste com a morte de Osama Bin Laden. Mas também não compartilho do discurso hip-hip-hurra que muita gente tem adotado. Matar alguém não é lá algo digno de comemoração. O que deveria nos fazer civilizados, em oposição a bárbaros terroristas e assassinos em geral, é justamente não compartilhar de seus métodos. Pode o homem sentir-se, quiçá, aliviado com o fim de seu algoz. Mas feliz por ter matado uma pessoa?

***

O discurso que Barack Obama fez na noite de domingo (horário de Washington) termina em um tom entre o triunfalista e o messiânico. Primeiro ele disse que os Estados Unidos podem fazer o que lhes der na telha – "we are once again reminded that America can do whatever we set our mind to". Em seguida, falou nos sacrifícios feitos pelo povo estadunidense para que o mundo seja um lugar mais seguro – "That is the story of our history, (...) our sacrifices to make the world a safer place."

É justamente este tom arrogante que faz com que muitos se voltem contra a nação mais poderosa do mundo. Condição, aliás, que o presidente Obama fez questão de lembrar – disfarçadamente, mas de modo não muito sutil: "Let us remember that we can do these things not just because of wealth or power, but because of who we are: one nation, under God, indivisible, with liberty and justice for all."

Para encerrar, a típica inspiração puritana que fecha muitos discursos de presidentes ianques – "May God bless you. And may God bless the United States of America." – poderia ser facilmente substituída, do outro lado do mundo, por "May Allah bless the Islam". Ao fim e ao cabo, estão todos querendo provar que são melhores que os outros. Ou mais predestinados.

***

Sim, a campanha para a reeleição já começou.

***

"O mundo caquinho de vidro
Tá cego do olho, tá surdo do ouvido
O mundo tá muito doente
O homem que mata, o homem que mente"

(O Mundo - André Abujamra / Karnak)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O cego na faixa de pedestres

No Rio de Janeiro, os motoristas têm o estranho hábito de parar seus veículos após o sinal, fechando o cruzamento. Ninguém pode esperar atrás da faixa de pedestres pela liberação do tráfego à frente. Assim, quando o farol fica verde na transversal, os carros do outro lado não podem se mover. Na prática, todo o mundo anda quando o semáforo da sua via está vermelho, pois, enquanto ele estava verde, o cruzamento estava bloqueado pelos automóveis que vinham na perpendicular.

Nunca consegui entender essa atitude mesquinha dos condutores cariocas. Além de atrapalhar o trânsito, prejudica os caminhantes, que ficam sem faixa de pedestres para atravessar. Ontem, uma dessas cenas de caos urbano me deixou aterrorizado e me fez perceber como esta prática contraventória pode ser perigosa. Um cego tentava cruzar a Avenida Heitor Beltrão, na Tijuca (para quem não conhece, uma via com três ou quatro faixas de rolamento, dependendo do trecho). No meio da pista, deparou-se com um ônibus atravessado sobre a faixa. Parou, pensou e resolveu dar a volta pela frente do coletivo, escolhendo o mais longo e mais perigoso percurso. Certamente imaginou que a condução estava só um pouco avançada, já que o sinal estava fechado para os veículos. No entanto, o ônibus, além de ocupar a faixa, bloqueava parte do cruzamento adiante.

Os riscos eram grandes: 1) o lotação poderia se mover sem que o condutor percebesse o lusco homem tateando a viatura; 2) conseguindo passar o coletivo, o cego poderia ser atropelado por um utilitário em movimento na faixa da direita (como vimos acima, independente de o semáforo estar aberto ou fechado); e 3) como o deficiente visual passaria por fora da faixa, à frente do ônibus, pelo cruzamento, poderia ser atropelado pelos carros que viessem pela transversal.

Felizmente, um rapaz veio correndo em seu socorro e o ajudou a atravessar as duas ruas por entre os veículos que, dos dois lados, aboletavam-se sobre as listras brancas que deveriam ser o território e a segurança dos transeuntes.

domingo, 13 de março de 2011

Tempestade

Quando o mar bater mais forte
e nos jogar pra fora do barco,
talvez não haja mais mar
e talvez não haja mais barco.

[23.07.1991]

Je ne suis plus le même, je suis un autre

Um rabisco antigo, feito em momento de tranquilidade. A frase do título acompanhava o desenho. Não me lembro por que a escrevi em francês. 

domingo, 6 de março de 2011

Achei bela morena

Tenho escrito muito pouco. Não à toa, fico catando poemas do passado para publicar na minha página no Multiply. Nas duas ou três vezes por ano em que me ocorre uma nova poesia, tenho que reaprender a escrever. Deve ser por isso que em dezembro me saiu este soneto que chamei "Itororó". O formato de dois quartetos e dois tercetos, todo rimadinho, era coisa que eu fazia há mais de vinte anos. Mas, enfim, já que perdi a prática...

O título faz referência à cantiga de roda ("Fui no itororó, beber água não achei / achei bela morena..."). Aliás, um título controverso, já que há quem cante "tororó", sem o i. Na dúvida, fiquei com itororó mesmo, que significa "pequena cachoeira". Gosto da cachoeira, que pode ter vários significados no poema.

Soa bobo, o poeminha. O ritmo, a música, o tom, são meio arcaicos. E, no entanto - para mim ao menos -, há muitas imagens por trás, algumas referências e até histórias que podem ser minhas ou de qualquer um. Não espero que gostem nem que entendam. Os dois meses que levei para colocar as vírgulas nos lugares certos (eu acho), trocar umas palavras e encontrar o último verso não adiantaram grande coisa: continua soando pueril. De qualquer forma, compartilho, torcendo para que uma ou outra pessoa entenda e consiga ver mais do que um mero soneto. Quem quiser, pode deixar sua interpretação aqui. Impressões negativas serão recebidas com humildade. :-)

Itororó está disponível em http://eduardoviana.multiply.com/journal/item/22/22.

sábado, 29 de janeiro de 2011

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A Elegância do Ouriço e Desenrola

Publiquei no Multiply duas resenhas sobre obras de arte completamente diferentes. Um romance francês e um filme brasileiro. Para quem se interessar, seguem os links:

Sobre A Elegância do Ouriço, de Muriel Barbery: http://eduardoviana.multiply.com/reviews/item/28

Sobre Desenrola, de Rosane Svartman: http://eduardoviana.multiply.com/reviews/item/29

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Rotina

A vida é uma eterna rotina de labores diários. Nem se fôssemos reis seria diferente. Apenas os labores seriam outros.