domingo, 19 de dezembro de 2010

Belém, Pará

caboclo no rioHá duas maneiras de ver Belém. Primeiro, a otimista. É uma cidade pitoresca, de ruelas estreitas e casario antigo que lembram a rica história de entreposto exportador das "drogas do sertão", no século XVII, e da borracha, no final do século XIX e início do XX. Cortada por rios e igarapés, Belém recende a peixe. Na beira dos rios e nos igarapés, vêem-se curiosas casinhas de madeira, construídas sobre palafitas. Ali o caboclo leva sua vida em perfeita comunhão com a natureza.

Dizem que os colonizadores portugueses só se preocuparam com o Pará depois que a França tomou conta do Maranhão. Com medo de perder suas terras para os franceses, Portugal varreu-os do Maranhão e começou a povoar, em seguida, o Norte do país.

Belém foi fundada em 1616. Ao descobrirem as "especiarias" da região amazônica, os colonizadores interessaram-se mais por este pedaço de terra. Para eles, era mais barato colher os temperos nativos da floresta brasileira do que comprar pimenta, cravo e canela na Índia. O interesse era tanto, que o Marquês de Pombal mandou para governar a região um homem de sua inteira confiança: seu próprio irmão.

mercado Ver-o-PesoO período áureo veio quase três centenas de anos depois. Na virada do século XIX para o XX, o látex extraído da seringueira, árvore nativa da Floresta Amazônica, rendeu muito dinheiro para o Brasil. O "ciclo da borracha" expandiu as fronteiras do território nacional, como todos viram na minissérie da TV Globo. Ocorre que essa borracha, produzida nos estados amazônicos, só tinham um meio de sair da região: descendo o Rio Amazonas até o mar. Ocorre também que na foz do rio, no caminho do mar, está Belém. Em 1907, o governo federal abriu licitação para que fosse construído um porto descente na cidade. Nos anos seguintes, o norte-americano Percival Faquar trabalhou arduamente na construção do porto, situado na baía do rio Guajará. Só que as coisas começaram a complicar. A crise foi deflagrada quando os ingleses começaram a produzir borracha a partir das seringueiras que levaram para a Malásia. Faquar foi à falência e o governo brasileiro, seu maior credor, assumiu o porto. A Segunda Grande Guerra deu novo gás à exportação da borracha, mas foi uma recuperação passadiça. Tão logo acabou a guerra, terminaram os grandes pedidos de compra de borracha e a região amazônica voltou mais uma vez ao ostracismo, do qual só sairia mais de 50 anos depois, com a nova onda ecológica e a biotecnologia.

cortiçoMas Belém ainda não se recuperou. A outra maneira de ver a cidade é a pessimista. Cortada por mananciais d'água de diversas proporções, a capital paraense cheira a esgoto. Um monte de casa velha e malcuidada desafia a lei da gravidade enquanto é tomada por plantas imensas. Nascem árvores nas paredes. Ruas e calçadas estreitas oferecem pouco espaço para a circulação de carros e pedestres. A população ribeirinha vive muito mal em suas casas de madeira precariamente construídas sobre a água: falta luz, falta esgoto, falta escola, mas a cerveja chega de barco e em carroça puxada pelo homem. E, no fim das contas, para quem não é grande fã de botânica, uma caminhada na Floresta Amazônica não parecerá tão diferente de uma caminhada na Mata Atlântica. Mato é tudo muito parecido.

(Escrito em maio de 2007)


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Mais fotos de Belém em http://eduardoviana.multiply.com/photos/album/4/4