domingo, 24 de outubro de 2010

Um pouco de História do Brasil

O Brasil, como o conhecemos hoje, com suas 27 unidades federativas, talvez não existisse se a família real portuguesa não houvesse por aqui aportado no início do século XIX. Segundo nos conta Laurentino Gomes no livro “1808”, o país não tinha, àquela época, a identidade nacional que hoje tem. A monarquia portuguesa e o império brasileiro enfrentaram diversos movimentos separatistas entre os séculos XVIII e XIX. Em geral, não visavam à independência do Brasil como um todo. Os interesses das províncias eram díspares entre si.

De acordo com os historiadores, a nação brasileira começou a adquirir coesão quando o príncipe-regente D. João chegou com sua família, fugidos das tropas de Napoleão. Nos anos seguintes, o monarca português criou as primeiras instituições brasileiras, tais como a Biblioteca Nacional, o Banco do Brasil e as primeiras escolas de medicina, na Bahia e no Rio de Janeiro. O Brasil – que até então era um país fechado ao mercado internacional, desintegrado nacionalmente e de baixíssima formação científica – começava a nascer como nação.

Um século mais tarde, o Brasil, já independente de Portugal e republicano, tornara-se uma potência agroexportadora. Cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Manaus começavam a se urbanizar. Celso Furtado mostra, em “Formação Econômica do Brasil”, como o dinheiro do café ajudou os primórdios da industrialização paulista. O Presidente Washington Luís (1926-1930) abria estradas com o objetivo de facilitar a circulação de mercadorias.

Vieram os movimentos tenentistas da década de 1920, a crise de 1929 e o consequente fim da “República do Café com Leite”. Caio Prado Júnior, em “História Econômica do Brasil”, apontava três problemas que atravancavam o desenvolvimento econômico nacional naquele período: mercado interno de consumo restrito, matriz energética deficitária e falta de siderurgia.

A crise do modelo econômico brasileiro baseado na exportação vigoraria por mais de 15 anos. Foi apenas durante a II Guerra Mundial (1939-1945) que o Governo Federal começou a investir em siderúrgicas, dentre as quais a mais importante foi a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Mais adiante, em 1953, Getúlio Vargas fundava a Petrobras. Alguns dos entraves ao desenvolvimento da indústria brasileira começavam a ruir.

Apenas a partir dessas mudanças estruturais, Juscelino Kubitschek (1956-1961) poderia por em marcha seu plano de crescer 50 anos em cinco. Sem siderurgia e petróleo, não seria possível criar uma indústria automobilística nacional. Um tipo de indústria que também está associado a uma mão de obra mais qualificada do que aquela empregada na rudimentar indústria têxtil.

De 1808 a 1960, o Brasil se transformou radicalmente.

A crise política que vinha se manifestando desde o segundo governo Vargas eclodiu no golpe militar de 1964. Deixando de lado o nefasto legado de retrocesso civil e sem negar o abominável caráter repressor de uma ditadura, devemos aos governantes militares (1964-1984) a implantação de uma infraestrutura nacional de telefonia, com a Telebras, e a expansão da matriz energética, com a construção de usinas hidrelétricas, tais como Itaipu. O Brasil chegava à posição de 8ª economia mundial, malgrado as profundas carências de seu povo.

A redemocratização chegou junto com uma inflação galopante, fruto, entre outras coisas, do endividamento brasileiro (público e privado) oriundo do esforço do desenvolvimento. Uma sucessão de planos econômicos tentou, sem resultados duradouros, debelar o câncer que consumia o poder de compra dos brasileiros. O Presidente José Sarney (1985-1990) tabelou os preços e o resultado foi a desaparição dos produtos das prateleiras dos mercados. O governo Fernando Collor de Mello (1990-1992), em seguida, procurou conter a inflação reduzindo a quantidade de papel moeda em circulação, enxugando os gastos governamentais e diminuindo as taxas de importação. Conseguiu uma redução inflacionária temporária, às custas de uma severa recessão econômica. Por outro lado, estimulou a competitividade, pois, com a concorrência dos produtos importados, a indústria nacional teve que se tornar mais eficiente para sobreviver.

Itamar Franco (1992-1994) assumiu o leme de um país mais moderno, mas ainda vítima de uma inflação elevada e de uma distribuição de renda injusta. Seu governo instituiu o Plano Real, o único a apresentar resultados perenes no combate à inflação. O resultado foi uma imediata melhora no poder de consumo do brasileiro.

Fernando Henrique Cardoso foi eleito em 1994, na esteira do sucesso do Plano Real. Durante seus dois mandatos consecutivos (1995-2002), uma série de crises econômicas mundiais colocou o Plano Real à prova. Foram necessários ajustes, tais como a flexibilização do câmbio monetário e a adoção do regime de metas inflacionárias. A adoção do novo modelo econômico associada ao estabelecimento de regras de transparência, à informatização dos serviços públicos, à promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal, entre outras medidas, estabilizou o país econômica e politicamente. As empresas brasileiras tornaram-se competitivas e algumas chegaram a se internacionalizar. O mercado de capitais ficou mais robusto, reduzindo a necessidade de financiamentos estatais para empresas nacionais. As privatizações (que haviam começado no mandato de Collor de Mello) retiraram do Estado atividades que já não dependiam de seu empenho, como ocorria nas décadas de 1940 a 1970. Foram realizados esforços para desburocratizar a máquina pública, com a criação de Organizações Sociais, por exemplo. As empresas privatizadas desenvolveram-se rapidamente, gerando mais empregos e pagando mais impostos. No setor de telefonia, a malha expandiu-se velozmente e a concorrência possibilitou o avanço da Internet de banda larga e da telefonia móvel. Programas sociais como o Bolsa Escola, idealizado por Cristóvam Buarque quando era governador do Distrito Federal e reaproveitado por FHC no Governo Federal, serviram às camadas mais pobres da população.

Ao longo de todo este processo que vimos do ponto de vista econômico, o país avançou em muitas áreas. Centros de excelência científica e polos tecnológicos foram criados no decorrer de todo o século XX e início do século XXI. As universidades se espalharam. O ensino técnico evoluiu. O ensino básico foi universalizado. As campanhas de vacinação deixaram de ser motivo de revolta popular para virarem sucessos e referência para o mundo.

Em cerca de 200 anos, milhões de brasileiros, alguns portugueses e outros tantos imigrantes construíram um país chamado Brasil. Um país que hoje se vê como uma grande nação. Não se pode apagar a história dizendo-se que tudo começou em 2003. O PT não fundou o Brasil. Nem é dono dele.

6 comentários:

  1. Mas é fato que foi decisivo pra, finalmente, repartir um bolo que há décadas (ou séculos) apenas crescia. rsrsrs...
    abraço, meu caro...

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  2. Parabéns pelo texto.
    Tem circulado pela internet tabelas que comparam os números do governo Lula com o do FHC.
    Tal comparação é injusta, pois o governo Lula se beneficiou da economia já estabilizada ao chegar ao poder. Além disso, o Brasil foi beneficiado nos últimos anos por um conjunto excepcional de fatores positivos do setor externo. Qualquer que fosse o presidente nos ultimos 8 anos, os numeros inevitavelmente seriam favoráveis ao presidente mais recente.
    Como você bem concluiu, "não se pode apagar a história dizendo-se que tudo começou em 2003".

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  3. Bela abordagem, Eduardo. O país que se construiu nos últimos anos é o escolhido pelo povo. Foi o povo que mostrou disposição para enfrentar a inflação ainda no tempo do Sarney, quando o Plano Cruzado - mesmo tendo se transformado em uma fraude - saiu como grande vitorioso das eleições para governador. Foi o povo que tirou o FHC quando achou que já era hora de substituir a política econômica bem sucedida mas totalmente ortodoxa por outra, mais flexível, capaz de gerar mais emprego e renda. É o povo que está mostrando que, pela primeira vez em muitos anos, não é a economia que vai decidir a eleição. Para o bem e para o mal, é esse o recado que se lê quando a educação ganha espaço nos discursos dos eleitos (a primeira medida do nosso governador foi substituir a secretária de Educação, lembra?), alguns discutem União Civil, outros aborto e outros ainda, liberdade. A política econômica de um ou outro candidato não será muito diferente. Pena que o país que os marqueteiros estão nos vendendo seja tão conservador.
    Beijos

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  4. Em tempos desistoricizados, em que a campanha é dominada pelo imediatismo espetacular e promessas megalômanas, uma análise sóbria e equilibrada como a aqui empreendida representa um movimento de resistência contra o perigoso niilismo que o neopetismo vem tentando inculcar na mentalidade política da população.

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  5. Agora, que a campanha presidencial já passou, posso postar um comentário fora desse contexto. Um comentário acerca apenas do seu texto. Gostei da sua escrita, Edu. Uma boa síntese da economia do Brasil nesses últimos 200 anos, que lemos sem nenhum esforço.

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  6. Obrigado, Ari. Não sendo historiador nem economista, fico feliz que minha síntese tenha lhe agradado. A reflexão política vai além do período eleitoral e acho que a discussão continua válida.

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