Mostrando postagens com marcador cinema. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador cinema. Mostrar todas as postagens

domingo, 5 de fevereiro de 2012

II Guerra e a origem do mal

"Nada autoriza a ideia tão disseminada de que o passado humano foi bucólico, pastoril e pacífico. Há poucos séculos, matavam-se pessoas com base em superstições avalizadas pela hierarquia religiosa, a escravidão era oficial e apenas discordar da opinião vigente podia equivaler a uma sentença de morte."
[Steven Pinker, professor de psicologia de Harvard, em entrevista à revista Veja de 4 de janeiro de 2012]

Em setembro de 2010, escrevi uma resenha sobre o filme "A Fita Branca", de Michael Haneke, deixando de lado o argumento de alguns críticos sobre a formação do caráter da geração que criaria o nazismo alemão. Segundo tais críticos, Haneke desejava buscar em sua obra a origem do ódio que provocou o Holocausto.

Após ler a biografia da amante de Hitler – "A História Perdida de Eva Braun" –, comecei a considerar que tais críticos tinham razão. O Führer nasceu em uma família completamente desestruturada. Seu pai o espancava frequentemente e era de uma infidelidade doentia. Uma foto de Eva Braun no internato é assustadora: quase todas as crianças aparecem sujas, tristes e mal-vestidas. Segundo a autora, Angela Lambert, havia muita opressão à época. Essas crianças maltratadas poderiam mesmo vir a se tornar adultos cruéis como Himmler, Goebbels e outros figurões nazistas.

Crianças reprimidas do século XIX, que sofreram as humilhações impostas pelo Tratado de Versalhes quando jovens, e enfrentaram uma dura crise econômica quando adultas, tornaram-se, em parte, defensoras de um nacionalismo e de um racismo exacerbados.

Steven Pinker diz, em sua entrevista à Veja, que "no caso da Alemanha, é preciso observar que, por baixo da fina camada de verniz civilizatório da República de Weimar, o curto período democrático depois da I Guerra, fervia o nacionalismo retrógrado baseado na ideia da superioridade racial teutônica que descambaria no nazismo. Foi algo tão forte que apagou a noção do bem e do mal." Talvez a dificuldade de diferenciar o bem do mal tivesse origens ainda mais profundas, como aquelas mostradas no filme "A Fita Branca".

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Melancolia e a crítica da crítica

Um amigo discordou da minha opinião sobre o filme "Melancolia" (ver comentário em Filmes de 2011). Achei que valia a pena trazer esta discussão para uma nova entrada no blog. Se você, caro leitor, concorda, discorda ou muito pelo contrário, meta também seu dedo neste umbigo. Refletindo, conhecemos melhor o mundo e a nós mesmos.

***

Meu caro Pedro,

Adorei o seu comentário. É bom ouvir outras opiniões para reavaliar as nossas (seja para alterá-las ou não). No caso de “Melancolia”, você não me convenceu: continuo achando um filme menor do Lars von Trier. Concordo que a nudez platinada da Kirsten Dunst seja plasticamente bela. Embora não tenha entendido muita coisa, esta parte – a conexão da personagem Justine com o planeta Melancolia – eu entendi. Vou reformular minha afirmação: a cena é sem importância para a compreensão desta relação intensa entre Justine e o planeta Melancolia. E, justamente porque a cena não é necessária para esta compreensão, acho que há um quê de exercício de poder do diretor. Eu não disse que isso é ruim. Mas quis dizer (com uma dose de sarcasmo) que diretores “cults” conseguem colocar estrelas de cinema em situações vulneráveis graças ao poder natural que exercem. Expor sua nudez para milhões de espectadores é, na minha opinião, colocar-se em situação de vulnerabilidade. Ao menos pelos códigos vigentes (não somos silvícolas). 

Gostaria de discutir a impressão que tenho de que von Trier trata as mulheres sempre como forças da natureza. Em todos os filmes a que assisti dele, a mulher está no centro da história, movida a emoções, enquanto os homens exibem um verniz mais racional. Peguemos como exemplos os personagens de Dunst e de Kiefer Sutherland em “Melancolia”, e de Charlotte Gainsbourg e de Willem Dafoe em “Anticristo”. A natureza (que podemos interpretar como destino em algumas situações) é incontrolável, é “a igreja do diabo”, e só as mulheres entendem isso. Os homens tentam controlar a natureza e as ações humanas, procuram justificativas para seus atos (David Morse em “Dançando no Escuro” e Paul Bettany em “Dogville”), e explicações científicas ou terapêuticas para as coisas (Willem Dafoe em “Anticristo” e Kiefer Sutherland em “Melancolia”). As mulheres compreendem a natureza, “filiam-se” a ela, mas não compreendem os homens (entendidos como toda a humanidade em filmes como Dogville e Manderlay). 

Esta representação de força da natureza não está presente em todos os personagens femininos, é claro. Há aqueles que cumprem a mesma função dos homens nos filmes, ou seja, representam os vícios da humanidade. Mas as estrelas dos filmes de von Trier não são mulheres comuns, são alegorias. Justine (Dunst) não foge à regra: ela pressente o fim do mundo e, simbolicamente, se entrega ao destino na cena em que se deita nua à luz azulada de Melancolia. Enquanto isso, seu cunhado (Sutherland) tenta explicar cientificamente o inexplicável e, mesmo diante da iminente tragédia, se preocupa com as aparências e o dinheiro.

Feita esta digressão, retorno para um ponto impalpável: o da sensação provocada pela arte. Há obras que nos cativam e obras não nos emocionam. Nem sempre este efeito está relacionado à qualidade do trabalho do artista. O momento do espectador (leitor etc.) é fundamental. Neste “momento do espectador” entra também tudo o que ele consumiu anteriormente, inclusive – e principalmente, talvez – outras obras do mesmo autor. Como se pode depreender dos meus dois parágrafos anteriores, meu entendimento de “Melancolia” tem tudo a ver com o que eu entendo do que Lars von Trier vem tentando dizer em seus trabalhos. Justamente no cinema autoral é que acho mais difícil escapar a este percurso. Fosse apenas um diretor a soldo e não o escritor de seus roteiros, a comparação se daria em outro nível (no da linguagem fílmica, por exemplo).

É, de certa forma, injusto comparar “Caim” com “O Evangelho Segundo Jesus Cristo” ou “As Intermitências da Morte” com “Ensaio sobre a Cegueira” (como eu já fiz - ver http://eduardoviana.multiply.com/reviews/item/14), mas acho inescapável. Nossa compreensão do mundo é formada a partir das influências que recebemos. Assim, nossa interpretação das obras de arte também será influenciada pelas obras que consumimos anteriormente.

Um forte abraço,
Eduardo

***

P.s.: O uso do verbo "consumir" não quer dar à Arte um valor utilitário, de objeto de consumo. A melhor palavra a ser usada talvez fosse "fruir", mas acho um vocábulo muito feio. Usei "consumir" como síntese de "assistir", "ler", "ouvir", "ver" e o que mais servir para a interação de uma dada pessoa com uma dada obra de arte.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Filmes de 2011

Um amigo pediu minha opinião sobre os filmes da lista de melhores do ano do jornal Valor Econômico. Dos campeões, só não assisti a Árvore da Vida. Sobre os outros, enviei-lhe os comentários que aqui reproduzo. Lembro apenas que opinião é coisa pessoal, cada um tem a sua. Questão de gosto, de momento e de conhecimento. Se não gostei de alguma coisa, pode ser que não estivesse preparado para entendê-la. Ou, ainda, que não estivesse "no clima do filme". Enfim, fiquem à vontade para discordar.

Melancolia - Talvez eu não tenha entendido o filme, mas não achei nenhuma maravilha. Sou um grande fã de Lars von Trier, mas achei esta obra apenas melancólica (bem, talvez seja este o objetivo mesmo). Parece que o diretor, em toda a sua depressão, quis dizer que o mundo não vale a pena e pronto. Não há a ironia de "Os Idiotas", a contundência de "Dançando no Escuro" ou o apuro artístico e simbólico de "Anticristo". Acho que ele se perdeu um pouco. O mais significativo do filme foi ele ter convencido a Kirsten Dunst a ficar nua em uma cena sem importância. É aquela história do diretor cult colocando uma atriz famosa em situação vulnerável, o que é irônico como exercício do poder.

A Pele que Habito - É um bom filme, interessante, mas está longe de ser o melhor Almodovar. Não chega aos pés de "Fale com Ela", "Tudo Sobre a Minha Mãe", "Volver" ou "A Flor do Seu Segredo". Mas é melhor do que "Kika" e "Má Educação". Um Almodovar mediano, o que já é um bom motivo para assistir.

Meia-Noite em Paris - Um excelente filme de Woody Allen, com cara de Woody Allen (ao contrário de "Vicky Cristina Barcelona", que é muito bom, mas não parece Woody Allen). Gostei mais do que dos dois anteriores, que também são bons ("Você Vai Conhecer o Homem dos seus Sonhos" e "Tudo Pode dar Certo"). "Meia-Noite em Paris" é uma ótima lição para saudosistas. Adorei.

O Garoto da Bicicleta - Bom, mas eu esperava mais. Talvez seja o raio da expectativa, já que ouvi tanta gente elogiar antes de eu assistir. Acho que não é o tipo de filme que arrebata, mas é uma história bem interessante: uma mulher que passa a cuidar de um menino sem nenhum motivo. O garoto apronta e ela resiste, com uma paciência de Jó, compreendendo a revolta e a solidão do moleque. O garoto é um ótimo ator, muito bem dirigido. Mas o filme não chega a emocionar muito. O que talvez seja até uma qualidade, pois o risco de debandar para o melodrama é grande. Os diretores não apelaram para emoções baratas, o que é uma qualidade, sem dúvida.

O Palhaço - Gostei muito. Acho que o Selton Mello podia cortar algumas cenas ("Eu faço as pessoas rirem, mas quem é que vai me fazer rir?" é um pouco óbvio. Este tipo de melancolia está estampado na cara do personagem, não precisava colocá-lo em palavras, em uma cena sem grande função e que, repetida tantas vezes nos traillers, torna-se incômoda), mas é um filme capaz de levar às lágrimas. Singelo, honesto, sensível e nostálgico. Caetano Veloso diria que é um filme saído do "Brasil profundo". E é. Genuinamente brasileiro, repleto de emoções universais, como um "Cinema Paradiso" (universal, sendo italiano).

domingo, 5 de junho de 2011

Meu Umbigo viu "Todo Mundo Tem Problemas Sexuais"

Sou um frequentador do cinema brasileiro. Lamento que ele esteja, em parte, descambando para uma espécie de TV Globo na tela grande. "De Pernas Pro Ar", por exemplo, é uma mistura de Zorra Total e Sob Nova Direção com uma p(e)itada de Casseta e Planeta, na pele da Maria Paula. Um filme ruim toda vida. É melhor quando ocorre o caminho inverso e, por exemplo, "Cidade de Deus" dá origem a "Cidade dos Homens".

Mas, que seja: se o cinema dito "comercial" não sufocar o cinema dito "de arte", tá tudo certo. Se levar o público ao cinema e gerar renda para nossos técnicos, produtores, diretores, atores e toda a entourrage, beleza. Assim, talvez os produtores possam investir parte desta receita em filmes mais autorais.

E justamente porque sou um entusiasta do cinema brasileiro - e de caras como Domingos de Oliveira, que fazem filmes com uma marca própria - fui assistir a "Todo Mundo Tem Problemas Sexuais", ainda em cartaz, mas provavelmente não por muito tempo, como quase toda fita brasileira. É talvez o filme mais engraçado do Domingos. E também o tecnicamente mais fraco. Se ainda não viram, leiam minha resenha no Multiply: http://eduardoviana.multiply.com. E, se já viram, concordem ou discordem aqui.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

A Elegância do Ouriço e Desenrola

Publiquei no Multiply duas resenhas sobre obras de arte completamente diferentes. Um romance francês e um filme brasileiro. Para quem se interessar, seguem os links:

Sobre A Elegância do Ouriço, de Muriel Barbery: http://eduardoviana.multiply.com/reviews/item/28

Sobre Desenrola, de Rosane Svartman: http://eduardoviana.multiply.com/reviews/item/29

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

A Fita Branca

Acabou de ser lançado em DVD um dos melhores filmes de 2009: "A Fita Branca" ("Das Weisse Band", França/Alemanha). Fiz alguns comentários sobre o filme no Multiply: http://eduardoviana.multiply.com/reviews/item/27

domingo, 8 de agosto de 2010

Cinema: meu umbigo viu

A pedidos, estou colocando aqui no blog (veja na coluna da direita) links para todas as resenhas críticas que escrevi sobre cinema. Embora eu seja rigoroso com algumas produções cinematográficas, não fui muito rigoroso comigo mesmo em diversos textos. Há resenhas de que me orgulho um pouco, outras que são muito superficiais e algumas das quais eu certamente me envergonharia se as relesse.

O objetivo das tais resenhas era registrar meu parecer sobre determinadas obras. Um pouco até para mim mesmo, para me ajudar a pensar sobre elas (quando isto valesse a pena). Mas nunca tive a pretensão de "formar opinião". Existem jornalistas que ganham dinheiro para isso; eu escrevo de graça, meu único compromisso nas críticas é com minhas próprias ideias. Se você concordar com elas, ótimo. Se não concordar, ótimo também.

Em tempo: a última resenha foi escrita há quase cinco meses. O filme, portanto, mesmo se tratando de um blockbuster, já saiu de cartaz. Se você se interessar pelas resenhas e achar que eu as devo continuar escrevendo, deixe um comentário. Quem sabe eu me animo?